sábado, 24 de abril de 2010

Inclusão está literalmente na moda


Moda para deficientes físicos une ciência e estilo

Aqui está uma situação que você já passou milhares de vezes: experimentar uma roupa antes de comprá-la. No que você vai prestar atenção? Se ela está dentro dos padrões ditados pelas tendências da moda, se as cores ficam bem em você e se o caimento no corpo é perfeito, certo? Essas mesmas preocupações foram levadas em conta pelo estilista na hora de desenvolver a peça. Só que com um detalhe básico: ele ou ela imaginou como aquela bela roupa ficava em você de pé. Agora pense bem se esse caimento é o mesmo se você passa sua vida sentado. Ou caminhando com a necessidade de apoio. A resposta é, provavelmente, não.
Esse tipo de pensamento é o que rege a criação de quem trabalha com moda ergonômica e busca soluções em design e engenharia voltadas para pessoas que apresentem algum tipo de paralisia parcial no corpo ou até mesmo deficiência visual. "Não é a moda que diverge e, sim, a forma como ela é pensada, as técnicas de construção de uma peça. Ela tem que ser elaborada em cima de outra realidade, para no final você não notar que ela é diferente e principalmente deve dar uma qualidade melhor e um aumento de autoestima no indivíduo portador de deficiência", afirmou Fátima Grave, professora do Centro Universitário Belas Artes e pesquisadora na área de Modelagem Ergonômica junto à Fundação Selma, uma ONG de apoio a deficientes.
Uma das maiores especialistas nesta área no Brasil, Fátima apresentou sua coleção em um desfile realizado durante a 9ª Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação e Inclusão em São Paulo, que contou ainda com a participação do ator Ricardo Ciciliano, o professor Serjão de Malhação, da TV Globo, e um dos voluntários mais ativos da Fundação Selma. Desenvolver esse tipo de trabalho em moda não é baseado somente em intuição e, sim, em normas da física. "Tudo está de acordo com as três leis de Newton. O indivíduo fica de pé porque sofre um empuxo da natureza. A sua roupa também sofre a ação da gravidade só que o caimento dela é dominado também pelo corpo. Quando você trabalha com alguém parcialmente paralisado, tem de fazer essa leitura e buscar onde está o ponto de gravidade do corpo, para que lado ele pende, e para que lado o tecido é dominado. Ou seja, se eu descubro pontos gravitacionais, consigo alterar o caimento da peça porque eu estou agindo contra a natureza em busca de um casamento perfeito", disse Fátima.
A estilista está fazendo uma parceira com a empresa portuguesa Weadapt, criada em 2005 e voltada para a moda inclusiva. Um de seus representantes e professor da Universidade de Minho, Miguel Ângelo Carvalho, explicou como essa ciência funciona na prática: "Pensamos muito na funcionalidade. Por exemplo, não há sentido em um cadeirante usar calças com bolsos traseiros, porque não tem utilidade. O comprimento de um paletó ou blaser, por outro lado, não é o mesmo de uma peça comum, porque a pessoa fica sentada o tempo todo. Isso gera desconforto para ela. Da mesma maneira como você não veste uma roupa adulta tamanho G em uma criança, tem que adequar a moda a uma pessoa com deficiência."
Outro lado interessante pesquisado pelos estilistas é a autonomia de quem vai por e tirar aquela peça de roupa. Novas tecnologias são estudadas para facilitar abotoamento, zíperes e soluções de abertura nas roupas, mas que nunca sejam visíveis ao olhar. "O deficiente não quer ser diferente. A moda é igual para todos", disse Miguel. E a inspiração vem justamente do contato com os portadores de deficiências, médicos, fisioterapeutas e centros de reabilitação. São eles quem informam o que é preciso fazer para que a vida seja mais fácil, confortável e, porque não dizer, mais bonita.
Grande mercado, nenhuma ofertaO Brasil possui cerca de 30 milhões de pessoas portadoras de alguma deficiência física, segundo dados oficiais. E apesar deste enorme mercado potencial (que atinge também familiares), não há oferta dessa moda inclusiva em nenhuma grande rede brasileira. Fátima e Miguel estão trazendo a Weadapt para cá ainda este ano, com vendas pela internet, mas buscam criar parcerias com lojas que entendam a seriedade deste trabalho e que se disponham a investir em uma coleção voltada a deficientes.
E em tempos onde responsabilidade social se tornou uma forte ferramenta de marketing e imagem empresarial, e muitas vezes é confundida com plantar árvores, é de se estranhar que até agora ninguém tenha se manifestado a favor desse segmento. A edição brasileira da Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação e Inclusão é a terceira maior do mundo e foi a oitava vez que Fátima mostrou sua coleção ao público. Grandes marcas da indústria automobilística como Honda, Toyota, Volkswagen e Fiat marcaram presença no evento. Está realmente faltando alguma da área de vestuário. A moda para deficientes trabalha o que é bom para os olhos, seguindo as tendências do momento e ainda com técnicas do corpo e pode ser uma ferramenta de reabilitação de pessoas. Mais "vendedor" e "marqueteiro" que isso, impossível.
Serviço
A Fundação Selma é uma instituição sem fins lucrativos e não só aceita doações como trabalho voluntário, não importa qual seja a sua especialidade.
Para mais informações, ligue para (11) 5034.1566.

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