quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

A Escada

Por Paulo Roberto Cândido



Em uma comunidade de pessoas cegas havia uma escada. Ela possuía 100 degraus, porém, todos diferentes, uns largos, outros estreitos, alguns ásperos e mais outros lisos, enfim, degraus que dificultavam o acesso ao topo, devido a tantas irregularidades.

Naquela sociedade de cegos havia muitos estabelecidos nos primeiros degraus, outro tanto espalhado ao longo da escada, poucos conseguindo chegar aos patamares mais altos e muitos, muitos mesmos, ainda sem alcançar o primeiro degrau. Aqueles habitantes que não eram cegos e que viviam na mesma região dos deficientes visuais que buscavam subir na escada, facilmente observavam as dificuldades de todos em equilibrar os passos nos degraus tão irregulares. Mas ninguém estava disposto a ajudar para mudar aquela situação, no máximo, se trouxesse dividendos ou reconhecimento é claro, um ou outro poderia fazer algo em prol da inclusão de degraus mais acessíveis. Será que ninguém está vendo isso?

Onde está o carpinteiro para consertar os degraus? Onde está o Rei para melhorar o acesso dos seus súditos à escada? Onde está a indignação dos cegos que não lutam por uma subida mais justa e acessível? O certo é que muitas perguntas surgiam e poucos se preocupavam com as respostas das mesmas.
Como os poetas, sonhadores, guerreiros, filósofos, bons justiceiros e pessoas que enxergam mesmo sem ver, sempre existem, sejam nas fábulas ou na vida real, não seria diferente naquela terra de cegos. Assim, dentre todos que subiam a escada ou simplesmente a observavam sem poder subir, havia um grupo de deficientes visuais com vontade de lutar para que a escada fosse reformada e principalmente, que permitisse o acesso ao primeiro degrau de quem estivesse impedido de alcança-lo.

Mas qual a melhor estratégia a ser adotada? Qual seria o melhor perfil para a liderança do grupo? O que cada degrau deveria oferecer para a segurança e a igualdade da subida de todos? Como sensibilizar o Rei e os outros súditos que não são cegos? No País desta história, como em todas as outras Nações do Universo, os cegos, estando fora da escada, no início ou no topo da mesma, na metade da escalada ou em qualquer parte do acesso, não importa, seja como for são sempre tratados como coitadinhos ou heróis que conseguiram ultrapassar alguns obstáculos e por isso, são colocados em pedestais de vencedores, por aqueles que pretendem ganhar dinheiro em cima desta simbologia de um cego que só venceu, por que recebeu tutelas, proteções ou migalhas de uma sociedade preconceituosa e hipócrita, que penalizada oferece uns bons paliativos para minimizar as limitações físicas, sensoriais e intelectuais das pobres e infelizes criaturas que sempre precisarão mendigar suas inclusões no meio social.

Para mudar tudo isso, um sábio compreendeu que a melhor maneira de reestruturar a escada era modificando primeiro o estilo da caminhada, ou seja, reorganizando os passos da coletividade, para que as passadas de cada um fossem capazes de alcançar os degraus da escada, com a mesma acessibilidade e justiça. Os que estavam passando pelos degraus lisos, por exemplo, deveriam cooperar com aqueles que ainda estivessem passando pelos degraus ásperos, os que já alcançaram o primeiro degrau, teriam que estender a mão e o coração para aqueles que sequer encontraram a escada no seu caminho e principalmente, aqueles que já chegaram ao topo, necessariamente e agradecidamente, deveriam calçar as sandálias da humildade e descer alguns degraus para ajudar a quem ainda não recebeu a oportunidade ou o merecimento para conquistar os mais altos lugares da escada.
O que esta pequena fábula tem a ver com nossas vidas reais? O que este esforçado escritor, que vos escreve, está tentando dizer? O que representa esta escada? Eu mesmo irei responder. Esta simples criação literária quer estimular toda a comunidade de pessoas cegas e com baixa visão do nosso País, que estão nesta lista de discussão ou que terão acesso pelo envio da mesma às outras listas, a participar do manifesto organizado pelo nosso companheiro Bebeto Pires, que através de uma petição pública redigida com o apoio do nosso também companheiro Diniz e dos representantes do CONADE, vem solicitar e justificar a isenção de impostos incidentes sobre leitores de telas importados, como uma demonstração de inteligência gerencial e justiça social por parte do Governo Federal. A escada representa o movimento dos cegos no Brasil, que precisa ser reativado e reorganizado, de maneira mais democrática e firme e principalmente, mais competente, para que os deficientes visuais possam ser respeitados como cidadãos iguais aos outros.

Para que esta fábula tenha um final feliz ou para que nossas vidas possam ter o início de uma felicidade real, convoco todos os indivíduos cegos e todas as associações que trabalham em prol dos deficientes visuais para que comecemos a reconstruir as escadas, as estradas, as sacadas, as pontes, as fontes e os horizontes que nos levarão ao topo das realizações e como toda caminhada ou subida começa com os primeiros passos, vamos iniciá-las participando, assinando, divulgando e vibrando, sem diferenças de degraus, do grande manifesto conduzido pela liderança desse bom baiano chamado Bebeto. Mas lembrem-se, seja qual for o degrau que atualmente ocupamos, a escada está assentada em um terreno comum à todos, que é a deficiência visual, por isso, precisamos nos esforçar para que ela possa estar firme no mesmo solo em que todos, indistintamente e com direitos assegurados, colocam as suas escadas.
Você do Norte, você do Sul, você do CentroOeste, do Nordeste, do Sudeste, enfim, de todos os rincões do Brasil, seja uma voz, seja uma emoção, seja um pensamento, seja uma ação, seja uma determinação, seja uma oração, seja principalmente uma multidão em prol das nossas lutas inclusivas, hoje são os leitores de tela, amanhã as cédulas acessíveis do nosso dinheiro, depois os passeios públicos regulares e sem obstáculos, mais adiante os financiamentos e outras isenções de equipamentos e assim por diante, mas tudo só será possível com união, trabalho, sem vaidades, com boa vontade e respeito a si e ao próximo.
"Cegos do Brasil, pés e mãos à obra, quem faz a sua escada não espera acontecer..."

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