quarta-feira, 2 de novembro de 2011

LEVE A DOR PARA PASSEAR

Paulo Roberto Cândido de Oliveira




"Deixe em paz meu coração, que ele é um pote até aqui de mágoas e qualquer desatenção, faça não, pode ser a gota d'água...". Assim, como escreveu nesta canção, um grande compositor brasileiro, muitos de nós estão com o pote repleto de sofrimentos e dores da alma, de forma que, não há mais espaço para nada que gere angústia, tristeza e depressão.

Quando estamos nestes estados sombrios e dolorosos, procuramos o isolamento, a penumbra e o silêncio, para que as lágrimas e os gemidos possam ter maior privacidade e o sofrimento tenha as suas emanações inteiramente aproveitadas. Afinal, quem chora, quem se desespera, quem se abraça fervorosamente com a dor, não pode estar diante da luz ou dos sorrisos alheios, que muitas vezes consideramos como uma afronta à nossa combalida alma de sofredor.

Certamente, um tempo afastado de tudo e de todos, sempre é bom para colocarmos as ideias nos seus devidos lugares. Porém, deixar que este tempo se alongue, poderá nutrir os sentimentos de prostração e subnutrir os desejos do coração, que nunca quer palpitar de dor e sim, ver o seu dono voltar a sorrir e a lutar pela vida.

Por isso, escolha um belo dia de sol, pode ser também um frio dia de chuva e leve a dor para passear. Quem sabe, ela não encontre motivos para doer menos? Não descubra um lugar onde será mais eficiente do que no seu coração? Esqueça o caminho de volta á sua casa quando você
retornar? Ou então, encontre pelo caminho, dores maiores do que a sua e se envergonhe. Enfim, não custa nada tentar, Aproveite enquanto está doendo, mas não demore muito, pois ela, sua dor, poderá se acostumar com a solidão, com a escuridão, ficar preguiçosa e não deixar você se movimentar para abrir a janela ou a porta.

Vamos lá, convide sua dor para um passeio. Comece por percursos curtos, vá até o jardim ou quintal, saia da cama e caminhe até outro local do seu quarto, ligue a TV, procure um canal desses que mostram viagens, lugares lindos, mares, montanhas, pássaros, pessoas alegres,etc. Se você for cego, ouça os sons destas paisagens, imagine mentalmente, use os outros sentidos mas evite as cenas iguais às suas ou aos seus cenários interiores de momento, nada de ninguém sofrendo, nada de dor estampada na tela, lembre-se, sua dor quer espairecer, quer aceitar seu convite para um passeio, mesmo que seja rápido.

Está bem, eu sei que dói demais, que não estou no seu lugar, que falar é fácil, que pimenta no dos outros é refresco, que sua dor não quer passear para não correr o risco de encontrar alegria abundante lá fora, diante de tanta escassez dentro de você. Mas se ainda não é o momento de convidá-la para passear, pelo menos, aproveite um instante que seja, enquanto ela estiver desprevenida e nem perceba aquele pensamento otimista intrometido, que quer entrar em lugar onde não foi chamado e saia do seu eu menor e veja o seu EU MAIOR mostrando sua força interior, sua capacidade de enfrentar e vencer problemas, sua condição de compreender melhor a dor e a sua vontade, antes escondida entre as lágrimas, de sair, de mudar o quadro mental, de pular fora dessa, de correr e gritar pra todo mundo ouvir, que você voltou a sorrir, a querer companhias humanas ao seu redor, que as janelas e portas estão abertas para a felicidade, que você foi um bobo ser que demorou muito a levar sua dor para passear.

Agora, se a minha espontânea e solidária crônica sobre a dor que precisa passear, não modificou de alguma forma o teor da tristeza que se instalou em sua casa interior, deixe-me pinçar uma poesia do meu livro "Viagem ao Céu Particular", para mandar um recado à tristeza, que não voltará, depois que a dor sair para passear:


TRISTEZA TRISTEZA

A tristeza voltou,
a tristeza sempre volta,
conhece todas as chaves da minha porta.
A tristeza ficou,
hoje ela tinha que ficar,
conheceu todas as angústias do meu olhar.
Amanhã trocarei todas as fechaduras
embriagar-me-ei com todas as bebidas quentes
e descobrirei que a tristeza voltou.
A tristeza sempre volta,
conhece quando a fé se esgota.
Um dia chegará
e neste dia a tristeza esquecerá o meu caminho
conhecerá outros olhos angustiados
sinalizando por sua volta.
Mesmo assim, a tristeza voltará
ela nunca está morta
conhece todos os mapas da minha rota.
Haverá um tempo em que ela não me visitará
e eu insistirei para que ela volte.
Abrirei todas as portas,
angustiarei o meu olhar,
mas ela não voltará,
a tristeza nunca volta
quando a alegria quer nos encontrar.


OBS: O Livro de Poesias "Viagem ao Céu Particular" de autoria de Paulo
Roberto Cândido pode ser adquirido na Biblioteca Braille Josélia Almeida
da Sociedade de Assistência aos Cegos.

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